(Poema:escrito um ano depois do massacre de dezenove sem terra em Eldorado de Carajás.)
os sem-terra afinal
estão assentados na
pleniposse da terra:
de sem-terra passaram a
com-terra: ei-los
enterrados
desterrados de seu sopro
de vida
aterrados
terrorizados
terra que à terra
torna pleniposseiros terra-
tenentes de uma
vala (bala) comum:
pelo avesso afinal
entranhados no
lato ventre do
latifundio
que de im-
produtivo re-
velou-se assim u-
bérrimo: gerando pingue
messe de
sangue vermelhoso
lavradores sem
lavra ei-
los: afinal con-
vertidos em larvas
em mortuá-
rios despojos:
ataúdes lavrados
na escassa madeira
(matéria)
de si mesmos: a bala assassina
atocaiou-os
mortiassentados
sitibundos
decubito-abatidos pre-
destinatários de uma
agra (magra)
re (dis) (forme) forma
-fome- a-
grária: ei-
los gregária
comunidade de meeiros
do nada:
enver-
gonhada a-
goniada
avexada
-envergoncorroída de
imo-abrasivo re-
morso-
a pátria
(como ufanar-se da? )
apátrida
pranteia os seus des-
possuídos párias-
pátria parricida:
que talvez só afinal a
espada flamejante
do anjo torto da his-
tória cha-
mejando a contravento e
afogueando os
agrossicários sócios desse
fúnebre sodalício onde a
morte-marechala comanda uma
torva milícia de janízaros-ja-
gunços:
somente o anjo esquerdo
da história escovada a
contrapelo com sua
multigirante espada po-
dera (quem dera!) um dia
convocar do ror
nebuloso dos dias vin-
douros o dia
afinal sobreveniente do
justo
ajuste de
contas
Poema originalmente publicado na coletânea Crisantempo, de autoria de Haroldo de Campos (São Paulo: Editora Perspectiva, 1998).
sexta-feira, 15 de maio de 2009
O anjo esquerdo da história – Haroldo de Campos
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Ana.
às 03:47
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